O chá gelado me acompanha nessa tarde, a promessa de chuva não se cumpriu, estou nostálgico com o barulho dos latidos, os cachorros me lembram infância, momento da minha vida que lembro com saudade, naquela época gostava de cachorros, gostava de seres humanos e chocolate, ainda gosto de chocolate. O chá gelado esquenta com o sol que teima em existir, pervertido e sem desculpa o brilho quente desse astro toma conta da tarde, meus pensamentos de luxuria, analises políticas, epistemológicas e estruturais não acompanha a hermenêutica cultural desse texto que sai a todo vapor da mente claustrofóbico e geomorfologicamente louca, meus anseios são colocados com letras garrafais, meus descuidos são elaborados pela lógica surreal, beijo a existência com essas linhas, com essas palavras. Viver é sonhar, sobreviver é continuar respirando, respirar não é utópico, a sobrevivência é prática e não é sonhada, sem sonho não há magia, somos sobreviventes frustrados sem a cor da arte. O chá gelado molha minha boca, é sonho.
Sonho com um mundo que já se foi, me lembro de fileiras brancas sendo aspiradas por narinas sedentas por algo a mais na vida. Maíra cheirava e sonhava com outras possibilidades, Carlos era algo anormal, Dom Quixote socialista, como era gostoso o boquete de Fernanda, o beijo de Sandra, as poesias eram escritas a base de vodka, as palavras bêbadas não eram geladas como o meu chá, eram quentes como o sol que brilha nessa tarde.
Um mundo melhor, paraíso terrestre, ele não chegou, o progresso não o trouxe, o iluminismo não cumpriu sua promessa, não choveu, somos seres frustrados e cônscios disso, a alma já foi vendida ao diabo, deus ainda lamenta isso, o latido some, o sol se esconde atrás das nuvens, minhas lembranças de uma juventude excitam minha memória, elas dançam na valsa de minhas idéias, na matrix de refletir, saio da caverna sem respostas, entorpecido pela realidade.
O sexo era embrulhado em um tom de pecado, pecamos em um tom de prazer, em uma nota de samba, a tristeza também vem no embalo, viver é sentir o amor, a dor, a falta de sentido, a paixão, o calor, a faísca de medo, morrer é dar fim a todos os perigos, sonhos, lembranças, bebo mais um pouco do chá gelado, refletir dá medo, viver é perigoso, estou entregue ao futuro que ainda não existe.
Me masturbo em frente ao espelho, vejo guerras, fascismos, independências, a viscosidade desce com um suspiro, lágrimas contidas afloram quando penso no grotesco, na beleza, a miséria de ser livre, a angustia desse ato, o chá está quase no fim, a vida também terá um, não sabemos quando, apenas aguardamos esse dia, ele não está escrito, programado ou idealizado por uma santidade ou pelo destino, apenas virá. Bebo, a alegria desse momento é sufocada por um tom de melancolia, os anos passam e ficamos mais sensíveis.
O sol está se pondo, o laranjado céu me enche de uma estética, de uma adoração, vibro com o encanto desse fim de tarde, viver é aproveitar momentos simples, contemplo, sou um marco entre um passado já enterrado e ressuscitado por minha mente e o presente carente, sou a possibilidade de uma vida em um novo amanhã, a morte me espera em alguma esquina, assim como a poesia faz nossas vidas menos torturantes.
A noite está quase chegando, bebo pela última vez o chá gelado.
tbm sonho com o mundo que já se foi. Refletir as vezes da medo demais, ficamos preocupados, paralisados, enfim, há tantas coisas que mudam nesse mundo...
ResponderExcluirbjos
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