quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

CHÁ GELADO


O chá gelado me acompanha nessa tarde, a promessa de chuva não se cumpriu, estou nostálgico com o barulho dos latidos, os cachorros me lembram infância, momento da minha vida que  lembro com saudade, naquela época gostava de cachorros, gostava de seres humanos e chocolate, ainda gosto de chocolate. O chá gelado esquenta com o sol que teima em existir, pervertido e sem desculpa o brilho quente desse astro toma conta da tarde, meus pensamentos de luxuria, analises políticas, epistemológicas e estruturais não acompanha a hermenêutica cultural desse texto que sai a todo vapor da mente claustrofóbico e geomorfologicamente louca, meus anseios são colocados com letras garrafais, meus descuidos são elaborados pela lógica surreal, beijo a existência com essas linhas, com essas palavras. Viver é sonhar, sobreviver é continuar respirando, respirar não é utópico, a sobrevivência é prática e não é sonhada, sem sonho não há magia, somos sobreviventes frustrados sem a cor da arte. O chá gelado molha minha boca, é sonho.
Sonho com um mundo que já se foi, me lembro de fileiras brancas sendo aspiradas por narinas sedentas por algo a mais na vida. Maíra cheirava e sonhava com outras possibilidades, Carlos era algo anormal, Dom Quixote socialista, como era gostoso o boquete de Fernanda, o beijo de Sandra, as poesias eram escritas a base de vodka, as palavras bêbadas não eram geladas como o meu chá, eram quentes como o sol que brilha nessa tarde.
Um mundo melhor, paraíso terrestre, ele não chegou, o progresso não o trouxe, o iluminismo não cumpriu sua promessa, não choveu, somos seres frustrados e cônscios disso, a alma já foi vendida ao diabo, deus ainda lamenta isso, o latido some, o sol se esconde atrás das nuvens, minhas lembranças de uma juventude excitam minha memória, elas dançam na valsa de minhas idéias, na matrix de refletir, saio da caverna sem respostas, entorpecido pela realidade.
O sexo era embrulhado em um tom de pecado, pecamos em um tom de prazer, em uma nota de samba, a tristeza também vem no embalo, viver é sentir o amor, a dor, a falta de sentido, a paixão, o calor, a faísca de medo, morrer é dar fim a todos os perigos, sonhos, lembranças, bebo mais um pouco do chá gelado, refletir dá medo, viver é perigoso, estou entregue ao futuro que ainda não existe.
Me masturbo em frente ao espelho, vejo guerras, fascismos, independências, a viscosidade desce com um suspiro, lágrimas contidas afloram quando penso no grotesco, na beleza, a miséria de ser livre, a angustia desse ato, o chá está quase no fim, a vida também terá um, não sabemos quando, apenas aguardamos esse dia, ele não está escrito, programado ou idealizado por uma santidade ou pelo destino, apenas virá. Bebo, a alegria desse momento é sufocada por um tom de melancolia, os anos passam e ficamos mais sensíveis.
O sol está se pondo, o laranjado céu me enche de uma estética, de uma adoração, vibro com o encanto desse fim de tarde, viver é aproveitar momentos simples, contemplo, sou um marco entre um passado já enterrado e ressuscitado por minha mente e o presente carente, sou a possibilidade de uma vida em um novo amanhã, a morte me espera em alguma esquina, assim como a poesia faz nossas vidas menos torturantes.
A noite está quase chegando, bebo pela última vez o chá gelado.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

VERÔNICA


Sinto Seus olhos cravados em minha carne, você não deixa de ser curiosa, não deixa de ler esse texto, quer saber, quer sentir a presença, não esquece a chuva, a raiva, o orgasmo, o gosto do meu pênis, a saliva doce e nostálgica de minha boca, você procura subterfúgios para seus sonhos nas linhas que escrevo. Você acha meus textos pedantes, agressivos, corrosivos, se encanta com a beleza que sai da lama, do esgoto e pinga nas sarjetas nojentas de minha imaginação. Não morre, não beija, não flerta pessoalmente, mas não deixa de ler esses malditos e mal escritos textos, a falta de sentido, o caótico, romantismo sem iluminismo, desigualdade comunista, isso é a vida e sua contradição, você não me ama, não senti saudade, mas quer ler meus textos, se excita com suas linhas verborrágicas.
Política, sociologia, filosofia, merda, cuspe, esperma, feridas sangrentas, pus da miséria, fome da mente, dor latente, exclamação sem interrogação, reticências conscientes, sexo inconseqüente, escrevo , distribuo idéias em contextos sem nexo, sem terror, rock ou balas de coco. Viva o nazismo e seus filhos bastardos, viva a democracia e sua putaria e sufrágio, viva o amor e sua dor, viva a paixão e o tesão, leia sua dissimulada essa palavras, leia meu colossal repúdio, meu texto sem baralho, essa farsa sincera sobre a sociedade, sobre mim, sobre tudo que rasteja, pensa e goza, tudo que é humano em nós.
Sinto seus olhos a me despir, sinto seu voyeurismo em meus parágrafos, pontos finais, as vírgulas estão tímidas  com o fuzilamento de seu olhar, você fita essas negras grafias, essas belas mentiras, esse claro cuspir de fogo, horror, excitação e amor, você gosta de ler, gosta de saber que existe algo nesse mundo abstrato, tem curiosidade em saber se vai ser citada, seu nome não aparece em nenhuma parte, frustração. Mas digo seu nome, faço sua vontade, grito bem alto como se fosse o nome do Deus cristão e depois me calo para refletir sobre minha desgraça, Verônica!

domingo, 20 de fevereiro de 2011

SANGUE E ESPERMA ( agora o texto completo, pois eu havia publicado somente a metade por erro.)

A fumaça denunciava a presença dos espetos de carne, a cerveja gelada chegava com aplausos, alegria em dia de sol quente, sorrisos gratuitos, o domingo brilhava como uma estrela, fervia, era um inferno em forma de arco-íris. Uma seleção de música sertaneja tocava na “caixa musical”, gritos e gargalhadas eram ouvidas pelas pessoas em volta da mesa do flamenguista.
Mulheres com ar de malícia, homens com rostos que pareciam ter saído de um vídeo game, tudo era estereótipo, era marca registrada de um mundo marginal, a periferia tem dessas coisas. Mais cerveja, música e carne assada em palitos de madeira, saias curtas, camisas coloridas e um homem com óculos escuro e camisa do flamengo. O sol brilhava e esquentava os sonhos, embriagados de alegria e álcool embaralhavam conversas, constrangiam a claridade com sua exuberante existência. A mesa do flamenguista era alvo dos olhares de todos naquele bar.
Ele chega discreto, roupa escura, velório? Tímido, pelo menos parecia ser, senta próxima a mesa onde o flamenguista e seus amigos fazem uma verdadeira revolução francesa em matéria de algazarra e balburdia. Beijos, conversas, muito barulho, muita coisa para ser vista e ouvida, o homem tímido de roupa preta observa tudo.
A música muda, o sertanejo dá lugar ao pop e ao romântico internacional, enquanto ouvia Bee Gees o homem de roupa preta se lembrava de Suelem, sua namorada, a última vez que a viu ela estava suja de sangue e esperma, bateram nela com socos e chutes, sua carne foi mordida, sua vagina e seu ânus foram fodidos, na superfície de seu corpo era visível seu sangue misturado com o esperma de três homens. Como não encher os olhos de água ouvindo Don’t Forget to remenber tendo a imagem de Suelem em sua mente?
A grama verde cheia de orvalho, sua boca seca de saudade, movimentos quase mágicos, assim era o cenário de amor onde Fábio conheceu Suelem, a grama parecia sair de sua imaginação, como era linda, como Suelem estava linda, a música do Bee Gees fazia sua melancolia tomar outra proporção. Enquanto ouvia a música e se lembrava das desgraças de sua vida ele observava a mesa do flamenguista.
O sol brilhava nas mentes insanas, os lábios se movimentando em conversas descomprometidas, bocas cheias de carne, cerveja e muita ousadia. Na mesa ao lado tudo era festa, insano despertar para a vida boêmia. Pablo e suas grossas e enormes mãos, Carlos e o Flamenguistas, a vida era contemplada pelo enfoque de um mundo sem sentido. Fábio observava tudo ao som de Bee Gees, sua memória o levava até aquele fatídico dia, seu presente o levava até a mesa do falmenguista.
Carne de sol, frango, linguiça, risadas, folhas ao vento, palavras sem nexo, tarde de domingo, missa de cafajestes, três tiros ,sangue, a mesa toda agora era um inferno colorido de vermelho, cerveja e gritos. Pessoas correndo, pessoas chorando, três homens mortos, Pablo, Carlos e o flamenguista. O cérebro de Carlos se misturou aos espetos, tudo era a mesma coisa, o sol esquentava aquele ambiente, os tiros levaram vida ao monótono dia tirando o suspiro daqueles três homens.
Fábio levanta vagarosamente, sua roupa preta escondia uma arma, uma pistola, ele atira, como é bom de pontaria, não erra. Três tiros, três mortes, ele já estava de luto quando chegou. A imagen de Suelem suja de esperma e sangue vinha a sua mente enquanto ele atirava, agora aqueles homens estavam mortos, os mesmos que gozaram em cima do sangue de Suelem e riram de prazer sádico.
A grama parecia ser mágica, ele podia sentir o cheiro dela, enquanto ia embora o bar ficava para trás e a música também, deixava os gritos e o horror ao som de Bee Gees e ia caminhando ao sol quente com sua roupa de luto. Fábio pensou em Suelem mais alguns segundos, não sorriu, não chorou, apenas lembrou do esperma e do sangue em seu corpo. O sangue se misturou ao vermelho na camisa do flamenguista.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

A CARTA


O ventilador gira levando  ar para todos os cantos, olho para as paredes, elas não olham para mim, o dia parece ter sido em vão, não tive muita fome hoje, a água bebi por precisão, fotografias no computador, imagens de pessoas a muito tempo esquecidas, elas ressuscitam em minha memória, criam vida, andam em minha imaginação, beijos, risadas, tristezas, brigas, tudo volta com intensidade, a música penetra em meus ouvidos como se estivesse me masturbando, ouço com atenção, a música é alegre, não combina com o momento, perco tempo pensando em soluções para minha vida, volto a escrever, o que me instiga a escrever é toda essa falta de alguma coisa, sempre percebo que me falta algo, procuro sem saber ao certo o que é, isso me leva a escrever, rabisco palavras soltas, frases sem sentido, parágrafos indecisos, textos cheios de dúvidas, pinto com violência o meu cotidiano, descrevo com preguiça o meu dia, reflito com angustia sobre a minha vida, ela não é um mar de rosas, não é um inferno, não sei bem o que ela é, somente posso afirmar o que não é, a certeza não caminha ao meu lado, ando sempre duvidando, escrevo mais um parágrafo.

Percorro a noite vendo acontecimentos, amores, aborrecimentos, bares, ruas iluminadas, praças com namorados, marginais, drogados, a noite é um aquário com os mais variados peixes, saio pela escuridão nadando em pensamentos loucos, a insanidade percorre meus neurônios, paro em um bar, bebo uma cerveja, volto para casa. Há uma praça perto de minha casa, passo por ela, aquele homem está lá, ele não fala com ninguém, já é tarde, o que será que ele está fazendo ali? Não sei, ele apenas está sentado olhando para o nada, sua barba, seu cabelo despenteado, sua roupa amarrotada, tudo contribui para que sua imagem fique desagradável, ele parece não se importar, volto de uma noite estranha, normal já que todas são estranhas para mim, ver esse homem sentado na praça também é normal, ele está ai todas as noites, ele é uma figura misteriosa, ainda não sei seu nome, ele mora aqui perto, fim da noite, dormir parece necessário.

Descubro o nome do homem, Caio, ele apareceu no jornal nesse dia, uma corda no pescoço e uma carta na mão, ele pulou da mesa da cozinha e ficou flutuando no ar, o que me chamou a atenção é que a carta não foi escrita por ele, mas por uma mulher a mais de vinte anos, eu gostaria de saber o conteúdo da tal carta, o que está escrito ali deve ter alguma coisa com o suicídio de Caio.

Beatriz caminha com o seu vestido azul, ela vai se encontrar com seu namorado Fernando, os dois vão a um restaurante, comem, bebem vinho e depois vão até a casa de um colega de Fernando, chegando na casa do colega de seu namorado Beatriz é apresentada a ele, "prazer, Beatriz", "oi, meu nome é Caio", assim se conheceram a mais de vinte anos, assim começa a história que iria me levar até aquele homem triste que ficava todas as noites sentado na praça.

Sento no banco onde ele estava semana passada, olho com melancolia para as estrelas, eu também não tenho muitos motivos para me alegrar, a noite continua esdrúxula, me pergunto qual a finalidade de um ser como eu continuar aqui, meu futuro parece ser tão vago, sem finalidade, continuo sentado no banco olhando as estrelas, o espaço seria uma ótima válvula de escape, eu poderia ficar na lua observando de longe a vida dessas pessoas, a carta me vem a mente, quero ler, quero mergulhar na vida daquele sujeito, a noite está fria, ela não é sentimental como eu.

Beatriz gosta da conversa com Caio, Fernando diz que são poucas as pessoas que conseguem fazê-la sorrir, Caio fica sem graça, ele é um bom comediante, deveria trabalhar com teatro, mas ele resolveu ser professor, Beatriz pergunta se Caio tem namorada, ele responde que não, ele é solitário, não tem facilidade em relacionamentos, mas não diz isso, apenas diz que está solteiro, já é o bastante, a noite parece ser pequena para tanto assunto, eles conversa por horas, Caio sente uma certa atração por Beatriz, ele sabe muito bem esconder seus sentimentos, ela apenas fica encantda com sua simpatia, seria um ótimo amigo para ela, aquele homem alegre e falante seria o mesmo triste sentando em um banco de praça, seria o mesmo suicida com uma carta na mão, ainda quero ler aquela carta.

Amanhece, a luz entra devagar em meu quarto, a luminosidade causa um efeito de alegria, ainda estou vivo, a porta aberta me deixa ver o corredor, penso como será meu dia, vou até o banheiro, escovo os dentes, enquanto me fito no espelho lembro de que esse rosto é o meu, essa face sem expressão me pertence, tenho que ir trabalhar, na rua o sol cai em corpos prontos para mais um dia nesse mundo, passo pela praça, ela está cheia de grama e saudade, ele nunca mais irá sentar-se naquele banco, tenho que ir trabalhar.

Ele olha no espelho, se masturbando e pensando em Beatriz, ele imagina o corpo que estava em baixo daquele vestido azul, como aquela boca gemeria de prazer, com movimentos frenético ele pega em seu pênis com firmeza, seu sonho, seu louco tesão solitário, ele suspira e pensa em Beatriz, goza, agora ele está mais tranquilo, olha para o lado e não vê nenhuma boca, nenhum carinho, ele chora, a solidão é um inferno, ele quer Beatriz, a paixão não tem limites, Caio irá descer até as chamas.

Vejo um artigo na internet, é sobre história, no texto está uma visão sobre a marcha para o oeste, o movimento bandeirante e a formação do povo e da cultura brasileira, o autor é Caio Silva, um historiador e professor que há cerca de uma semana se suicidou, ele era um fanático pelo movimento bandeirante, queria comopreender a formação da cultura brasileira a partir de uma perspectiva Weberiana e culturalista, ele queria muita coisa, eu queria ler a carta, ainda vou conseguir.

Pelo correio chega uma carta, Caio a lê com interesse, nela está escrito algo sobre Beatriz, ela morreu a mais de cinco anos, mas só agora ele recebe a carta escrita por ela e quardada por sua irmã, ele lê com lágrimas nos olhos, tem algo nela que o faz emocionar, ele tem um rancor e um ódio quardado no coração, tudo isso dá lugar ao conteúdo da carta, o perdão e a saudade batem forte em seu ser, ele sobe em uma cadeira, amarra uma corda em uma vigota, em seu pescoço um laço feito com a corda prende com força, ele pula, a morte o espera com ansiedade, a carta em sua mão.

Beatriz briga com Fernando, é o fim do relacionamento, depois de um ano de espera finalmente Caio terá a chance de ficar com ela, ele se aproxima, fica ao seu lado nos momentos de tristeza, não demora até que ele lhe dá um beijo, ela carente aceita, retribui, é o começo de um romance, é o fim da inocência, eles ficam juntos, Caio está apaixonado, Bearriz ainda gosta de Fernando, tudo caminha bem até que Fernando resolve voltar com Beatriz, como deixar um homem tão legal e reatar um relacionamento com um cara que só a traia? No coração ninguém manda, ela sente por Caio, mas volta com Fernando, Caio sofre calado, é mais uma vez um solitário, agora ainda tem um agravante, a saudade de Beatriz.

Vejo pela janela uma linda garota sentado no banco da praça, corro para lá, é Viviane, cabelos loiros, pele branca como leite, com apenas dezesseis anos já é pura beleza, eu com meus vinte anos tenho receio, ela é muito nova, mas quem consegue mandar no coração? Eu sento ao seu lado, contemplando a paisagem e sua lindas pernas, ela tem olhos castanhos que brilham mais que as estrelas, seus lábio parecem pedir para serem beijados, não conversamos, sou tímido demais, ela percebe que eu a olho, eu a desejo, ela vai embora, perco a aportunidade, sonho com ela durante a noite, no outro dia o sol invade novamente meu quarto, mais um dia de vida, isso já está ficando chato.

Um copo de vinho, um cigarro, ela bebe e pensa em Caio, enquanto isso ele está em um quarto de motel com uma prostituta, não sabe seu nome, não importa, falam sobre coisas fúteis, ela sabe sobre o mundo, ele sabe sobre história, ela já sofreu po amor, ele está a beira da loucura pelo mesmo motivo, dois perdidos no mundo, duas existências solitárias, ela faz sexo como ninguém, ele tem orgasmos, Beatriz em sua casa pensa em Caio, como ele era bacana e carinhoso, ela ama Fernando, mas sente um carinho especial pelo colega de trabalho do namorado, olha a fumaça, ela sobe, sonhos vão na mesma altura, ela seria feliz ao lado de Caio, Caio goza mais uma vez, a prostituta geme falsamente, ela tem que ganhar dinheiro.

Ao invés do mundo deveria existir apenas o nada, essa é a lógica, como surgiram as coisas? Do nada? De Deus? Mas ele também veio do nada, ou sempre existiu, o que é um grande absurdo, a vida é um absurdo, existir é algo inesplicável, vou vivendo e pensando o que será de mim, o futuro é nebuloso, ele ainda não existe, o passado deixa suas marcas, contribui pouco com minha angustia, sou livre para refletir sobre isso, Beatriz era livre para escolher, isso a angustiava, ela escolheu o que queria escolher, ficar com Fernando, se arrependeu por deixar Caio tão triste, a vida é assim, temos que optar, eu escolhi viver mais um dia, vou arriscar para ver o que irá acontecer, estou sentado no banco da praça, aquele homem de barba e cabelos despentados vivia aqui, ele pensava o que tinha feito de sua vida, ele não era um otimista, se parecia comigo, eu não fumo, ele também não fumava, Beatriz acende mais um cigarro, isso iria matá-la, o câncer iria corroer seu corpo, antes ela iria escrever uma carta para Caio, a morte é uma situação constrangedora.

Ela iria abandonar Fernando e se casaria com Caio, esse com rancor não a aceitou, ainda por cima estava grávida, ele não iria criar o filho do outro, ele nunca perdoou Beatriz, depois de vinte anos ele lê uma carta escrita por ela, na carta ela diz que o filho era dele, ela o queria, sentia sua falta e queria casar-se com ele, ele não aquentando a dor em seu peito pula com uma corda em seu pescoço, é o fim para ele. Beatriz nunca contou para Fernando que Paulo não era seu filho, ela não o largou, casaram e criaram o filho, ela morreria de câncer, mas antes escreveu a carta e entregou a irmã, essa a quardou, depois que Beatriz morreu a carta ainda ficou com a irmã por mais cinco anos.

Eu consegui ler a tal da carta, depois de lê-la fui até a praça, sentado naquele lugar comecei a pensar em Caio, ele era solitário como eu, enquanto me lembrava do rosto daquele homem o sol ia se escondendo atrás dos prédios, um tom laranjado tomava conta do horizonte, é o fim do dia, amanhã começa tudo outra vez, não sei se tenho ânimo e disposição para viver mais vinte quatro horas, no outro dia o sol entra novamente em meu quarto, as paredes iluminadas refletem o branco, levanto, escovo os dentes, lá fora há tanta alegria, passo pela praça, o banco está vazio, mais tarde estarei sentado lá a espera de algo, ainda não sei o que é, falta algo em minha vida, o sol brilha, o dia promete ser mais um, como os outros, ainda vivo, caminhando penso em Caio, ele não foi corajoso, não aquentou ver outro amanhecer.















quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

SOLIDÃO PÓS-MODERNA E O VIRTUAL


Preguiça, não consigo dormir, mesmo a chuva que cai sem frescura não me leva ao sono, não me atrai para o mundo onírico. Ainda não anoiteceu, a tarde sem sol cobre esse meu dia, iludi minha percepção, hoje não saí para trabalhar, essas tais de férias são fanfarronas, me faz ficar quieto, não sou adepto do silêncio, apenas fico quieto. Levanto, caminho, ninguém para conversar, a tarde segue firme seu destino, o meu está mal traçado, ainda tenho que pensá-lo.
Computador, ligo o computador, escrevo coisas sem nexo, olho recados, ouço música, a tarde ainda brilha sem sol, o tempo nublado com calor, esse é meu dia encantado. A internet é uma realidade que não fazia parte da minha vida na minha infância e adolescência, não tinha computador, muito menos internet é óbvio, mas tinha televisão, livros e amigos, poucos, mas tinha. Hoje não precisamos mais de televisão, livros e amigos, calma eu vou explicar...Não necessitamos deles para sairmos do marasmo da solidão, vamos continuar lendo livros, as vezes assistindo televisão, os amigos não irão se perder, a internet ocupou um pouco o espaço dessas pessoas e dos instrumentos de entretenimento, educação e leitura, hoje temos o mundo virtual.
A solidão no mundo pós-moderno é diferente, é uma solidão onde não se está solitário, você pode estar sozinho “fisicamente” e junto virtualmente de outras pessoas, temos filmes, blog’s, sites, várias redes sócias e amigos no mundo virtual, na matrix. Isso não é o bastante para se ter uma vida sociável, nunca vamos retirar as pessoas  “físicas” de nossas vidas fora da internet, da mesma forma nunca vamos deixar de ler livros fora da tela do computador. A internet é uma realidade, está ai, não há como fugir, hoje não fazemos parte do “mundo” fora dela, parece um pouco forçado a afirmação anterior, ela é  reflexo da importância que a rede virtual tem em nossa época, em nossa sociedade.
A chuva parou, o calor continua, ouço o latido dos cachorros de minha mãe, ouço pessoas trabalhando na construção do outro lado da rua, eu continua sozinho em meu quarto olhando para a tela do computador, minha vida pequeno burguesa passa diante dos meus olhos, escrevo a miséria de minha existência sem sentido e sem valor nessas loucas e breves linhas, compartilho com vocês minha percepção sem nexo, sem noção sobre esse caótico caminhar sobre a terra. Ser solitário nessa vida é ser uma pessoa ligada a outras no cibernético mundo. Mesmo a solidão sendo passageira, durando apenas uma tarde chuvosa, ela existe, penetra em meus poros e evapora pela minha imaginação, enquanto os outros habitantes dessa casa não chegam continuo mergulhado na rede, continuo plugado a essa atmosfera virtual.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

MORTE E SENTIDO DA VIDA PARA CARLOS


Não Sabia em que era bom, Carlos não sabia a sua vocação, não tinha talento para nada. Carlos não sabia cantar, não sabia fazer cálculos ou filosofar, era péssimo em oratória, sua relação com outras pessoas era quase inexistentes. Carlos não tinha Orkut, facebook, twitter ou qualquer outra rede social. Carlos não existia virtualmente, não tinha talentos artísticos, científicos ou qualquer outra coisa acadêmica. Carlos era uma derrota, assim ele mesmo pensava sobre si, sobre sua caminhada de lesma sobre a Terra.
Carlos não namorava, não amava e não ia a igreja. Como pode existir um ser humano assim? Perguntas não fazem Carlos mais inteligente, ele tinha coragem, não chorava com a dor, se masturbava pensando nos filmes pornográficos que viu na adolescência. Beijos, a lua beijava sua face na noite, ele olhava para aquele astro, olhava e contemplava um mundo em outra galáxia.
O carro corre, a luz percorre suas idéias, Carlos não poupa a vida daquele animal peludo, passa com o carro em cima do animal, para o carro, olha, não sente pena. Em casa comendo carne moída e bebendo café, mistura estranha, ele pensa na criatura se contorcendo na estrada, na dor que ela deve ter sentido, ele não aumentava sua batida cardíaca, ele nem piscava, a lembrança do gato morrendo na estrada era uma alegria implícita em sua mente. Ali, parado, comendo a carne moída e bebendo café Carlos teve a iluminação de sua vocação, de seu talento. Dali em diante ele passaria a fazer algo que somente ele faria com maestria, matar sem dó, sem ressentimento. Ele só tinha matado um gato atropelado, mas qual a diferença entre um gato e um ser humano? Todos irão morrer mesmo, assim pensava ele enquanto sentia o gosto do sal da carne se mistura com o açúcar do café.
A chuva caia sem timidez, o frio cortava a cerne de quem se arriscasse a sair naquela tarde, Carlos andava sentindo a água fria da chuva, o vento que fazia um barulho engraçado em seu ouvido, o mato molhado, a lama, tudo fazia parte do cenário, em sua frente caminhava um senhor, um velho amigo, ou melhor, seu velho mestre. Chegando no interior da mata Carlos coloca o senhor de joelhos, esse chora e lamenta sua vida de crimes e assassinatos, Carlos não lamenta, ele é profissional, está apenas ganhando dinheiro. Um tiro, o cérebro sai do crânio como mágica, o sangue se espalha pelo mato e pela lama, Carlos não se alegra, não fica triste, apenas vai embora sem olhar para trás, sem pensar em Osvaldo, aquele senhor que lhe ensinou a arte de manejar armas e matar seres humanos, agora Osvaldo está morto e o corpo de Carlos está molhado.
Osvaldo foi o primeiro homem que Carlos matou, depois se tornou uma rotina em sua vida, seu talento era incrível, pessoas eram esmagadas como baratas, mas ele não fazia isso apenas por Prazer, fazia por que tinha talento e precisava de um “emprego”, precisava de algo na vida para que ela passasse a ter sentido. A morte é um sentido para a vida, pelo menos era para Carlos.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

DEUS E O DIABO NO MOTEL


Ouvindo a trilha de Blade Runner e bebendo café, algo de estranho nessa tarde, olho para o horizonte, contemplo o nada, mas esse nada quente e medíocre não me aborrece, não me entristece, sou indiferente, esse é o problema, a vida não me toca mais com sua ironia ou emoção, me sinto um inorgânico ser, um ser sem pulsação. A tarde se esconde em um véu negro chamado noite, estou pronto para sair pelas ruas da cidade.
Naquela tarde sem graça, como o sorriso forçado de um palhaço triste, eu coloquei meu vermelho e barato carro para deslizar sobre o tapete asfáltico de minha cidade, ando por ruas e avenidas movimentadas, vejo lindas mulheres, vejo pessoas correndo sem destino, loucas baratas humanas prontas para a dedetização do destino, amém digo para minha consciência inconseqüente, alegre e sem pudor ela grita suavemente um canto de horror. Uma esquina, ela atravessa a rua com passos tímidos, sua roupa é cheia de estereótipo, um verdadeiro uniforme, ela é evangélica, seu jeito conservador, sua meiguice no olhar, não resisto, paro o carro e começo a conversar com a mulher. Primeiro pergunto seu nome, ela se assusta, mas não me trata mal, pelo contrário, conversamos, “eu me chamo Carmem”, “prazer Carmem, eu me chamo Fábio”; assim começa minha odisséia pelo s corredores do purgatório.
A noite cai, não faço nada de extraordinário. O dia vem, mais um dia, nada de mais, assim penso eu, assim caminha a humanidade, ponto final.
Dois dias depois ligo para Carmem, ela atende com sua voz sensual, algo me atrai nessa mulher. Combinamos de sair no sábado, depois de Travolta os embalos de sábado a noite nunca mais foram os mesmos. Chega sábado, chega o dia, nada de ansiedade, não sou mais adolescente, não sou mais um utópico e carente ser, sou apenas um tolo cheio de amor para dar, cheio de eufemismos para as desgraças da vida, encontro Carmem no lugar combinado. Eu bebo cerveja, ela suco, falo de coisas banais, ela fala de salvação, apocalipse e sobre família, imagino um lindo boquete, ela imagina coisas transcendentais, coloco temas ousados na conversa, ela não gosta de coisas que caras como Nietzsche dizem, amém mais uma vez.
Um motel, penso eu que poderia levá-la para lá, entro sem pudor naquele lugar, ela não reclama , não fico chocado com sua falta de ação, ela apenas sorri, que assim seja. Pouca conversa, beijos longos, mergulhos em abraços apertados, suspiros e sonhos, sua roupa no chão, uma linda mulher na cama, sem desculpas, sem platonismo, prazeres instantâneos, minutos de pura luxúria.
Um raio de luz, uma semente, uma vaga lembrança de momentos calientes, revoluções, orgasmos, baralhos presos em minha mente, formas geométricas, cinema e peteca, jogos desnecessários desse insano bailar pelo universo, continuo minha caminhada rumo ao nada, vago sem esperança pelas ruas de minha cidade, nunca mais vi aquela moça, seu sorriso ou ouvi suas pregações sobre o cristianismo ou seus suspiros durante o sexo. Nunca mais é muito tempo, a eternidade é uma utopia, coloco meus pensamentos políticos em uma arena, ele luta com gladiadores, com reformadores, a ética, o vulcão da inocência, o medo de uma vida sem alegrias, momentos curtos fazem a diferença. Não me esqueço daquela noite, não me esqueço que há pequenos momentos que permeiam nossas existências, sem esperança, sem lamentações, naquela noite Deus e o diabo estavam naquela cama, naquele motel, naquela noite não ouve revoluções, salvação ou grande discuções filosóficas ou artísticas, ouve apenas um pequeno momento, mais um dia se foi, mais um texto ficou. Amanhã talvez eu ainda esteja respirando, a vida é cheia de futuro.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

CONDENADO A VIDA


O apocalipse em retrocesso, caminhadas na lua, vagas lembranças de fogos, tumultos, quedas de muros, bastilhas e ideologias, serpentes mentirosas, corredores de luzes, psicodelia, amarras do destino, fiasco da religião, medo sem noção, lógica da emoção, vem barrocas memórias diluir em minha mente, passar por entre as sementes de conceitos perdidos, expectativas aflitas, em algum lugar do passado vejo a luz, a explosão, a formação, vejo um caminhar rumo a desertos, não vejo a morte.
Um cigarro, depois de gozar duas vezes ela fumo um cigarro, a cinco minutos atrás estávamos entregues ao prazer. Ela irá envelhecer, sua pele enrugada irá denunciar sua idade, eu irei ao seu enterro, lágrimas internas vão manchar minha reputação, eu não morro. Mordo os lábios que enfeitam meu rosto, o sangue me mostra que estou vivo, isso não é motivo de alegria para mim, respirar era um desafio, hoje é uma praga, odeia ter que viver.
A luz do sol não esquenta mais meu coração e nem envermelha minha pele, o céu acinzentado mergulha meu orgulho na poluição de emoções, na atmosfera de caos que reina nesse mundo, desmundo, sem fundo como um xeque, mate a filosofia e jogue seu corpo fora, mas eu não morro. Vi revoluções, mortes, fogueiras, injustiças, mentiras, vi cavalos sendo trocados por carros, mulheres de mini-saia, olhei pelas frestas do universo e enxerguei a falta de espírito na metafísica, sem paraíso caminhei com os mortos, olhei meus amores serem enterrados, crianças se tornarem velhos, somente eu estava condenado a sofrer eternamente, a não abraçar a morte, a eternidade é um chicote em minhas costas, Prometeu acorrentado, foda-se a inteligência.
O cigarro, nossa noite de amor exala sensualidade, câncer de pulmão na verdade, amor carnal preso na fumaça, na desgraça, na falta de graça de deuses desalmados, sou um deus preso na carne, um Jesus sem ressurreição, a cruz é minha existência, não tenho perdão.
Aquela boca que ainda a pouca me chupava, me beijava e falava coisas sobre literatura e política agora engole a fumaça do cigarro, eu invejo essa mulher, ela vai morrer, vai diluir seus sonhos, angustias, sofrimentos, tudo vai se tornar nada e eu continuarei a nadar na calamidade de meus sofrimentos, sem rugas, sem fim, caminhando até o pôr do sol e vendo ele nascer eternamente.
Sou como um vampiro, um Highlander, mas não morro com estacas ou se cortarem minha cabeça, eu não morro, aterrorizo a mim mesmo com minha longevidade, pensar que tenho que aproveitar a vida é uma piada, tenho todo o tempo que quiser para aproveitar, eu não morro, a morte no fundo é uma alegria, sem ela a humanidade estaria presa na monotonia, na falta de sintonia, morrer é ter uma razão para viver. Eu não morro.
A fumaça se apaga, ela está pronta para mais um ato de nossa peça sexual, ela goza no final, na vida e na morte, eu não morro, posso lamentar baixinho, sonhar com o fim, mas ele não chega.
Eu não fumo, não creio, não sonho, apenas caminho e minto que sou humano para mim mesmo.