segunda-feira, 28 de maio de 2012

NO FIM.


Acendo um cigarro, ligo o carro, a música é a velha canção do Roberto, os detalhes de minha vida se confundem com os da música, a melodia acende uma fogueira em minha alma, tudo gira confuso em meus pensamentos, tudo se agarra sem desespero ao passado e arrota poesias sem sentido de futuro.
As luzes da cidade brilham em mim, a escuridão lá fora faz parte da escuridão que reina nessas linhas, a música já é outra, a melancolia da letra continua, não combina com meu desejo tolo por alegrias, mentiras sinceras, quero tudo aquilo que o dinheiro não pode comprar, quero tudo o que não existe de verdade.
Gozar falsos sorrisos, lembrar de momentos juvenis, tocar o céu com a língua e morder pedaços de lua como sonhos cheios de doces, carregar a culpa do mundo dentro da consciência, precipício sem amor.
Abro os olhos, prostitutas passeiam na noite, garotos em buscas de aventura, mulheres sem platonismo, os olhos  do autor fitam o obscuro mundo, a fumaça do cigarro embaça minha visão, vejo agora borboletas coloridas, desenhos em preto e branco, guerras atômicas, escândalos políticos, heresias espaciais, amores medievais, constrangimentos gratuitos, dores no infinito, prazeres mundanos, paixões na imensidão. Vejo a escuridão, me sega a vontade correr, a fumaça do cigarro se mistura a meus devaneios sem freios, freio o carro, na esquina um vazio, dentro de mim um nada.
Agora toca Rotina, Roberto canta com sua breguice disfarçada, seu romantismo perdido no tempo, o tempo louco, o tempo que leva toda a beleza, que traz obscenos pensamentos, o tempo mergulha na fumaça do cigarro, o carro não para, a noite tudo é mais calmo.
Um bar, paro, entro, sento, uma bebida, gelada como os corações mais malvados, fria como meu olhar em dia de domingo, bebo sem vergonha, bebo o álcool amargo, a cerveja desliza por minha garganta, a cerveja me faz sorrir. Naquele bar eu olho os tipos, casais, gays, héteros, pessoas comendo, pessoas chorando, pessoas de todo tipo de...O carro, já estou fora do bar, meus olhos ainda estão fitando a loira de vermelho, o carro corre louco, sem preguiça pelo asfalto, a fumaça toma conta de mim, fumo as alegrias reprimidas.
A música ainda é do Roberto, a noite já não é mais minha, tudo já foi, tudo acabou, rasgo as veias desse monstro urbano, paro em frente aquela mulher, seus cabelos ruivos, sua boca falando indecências. Estou sufocado, quero gritar, quero correr, pego um livro para ler, enquanto reflito sobre o mundo esqueço do mesmo, a ruiva aparece em minha frente, seus gemidos, aquela noite.
Embriagado de tanto viver pulo pelo espaço sideral, caio no meio do quintal de alguém, saio de mim, entro dentro dos longos beijos molhados, a ruiva morde o amor, morde meu corpo, faz do sexo brinquedo sem igual.
O carro não para, enquanto fico acordado penso se a vida é mesmo necessária, o existir é mesmo algo planejado, enquanto penso meu pé pisa no acelerador, o carro corre, uma pessoa, de repente, um grito, um barulho, uma batida. O sangue escorre por todo lado, sirenes, ambulâncias, enquanto o sangue escorria pelo meu corpo, eu vibrava, algo estúpido, atropelei alguém. No fim tudo é humano, mesmo a desgraça, mesmo a solidão, mesmo eu. No fim não há fim.

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