O
governo federal deveria mesmo intervir no Rio de Janeiro, e deveria
ter feito isso a mais tempo, por exemplo, quando a população do
centro da cidade foi expurgada pela vassoura higienizadora do
progresso urbanizador do prefeito Pereira Passos no início do século
XX. O governo federal poderia, e devia, ter intervindo quando a
desigualdade socioeconômica assolou a população carioca, pessoas
humildes ficaram desalojadas, sem saúde, educação e sem renda
suficiente para sobreviver dignamente na cidade maravilhosa; ficaram
apenas maravilhadas com o turismo, com as cenas das novelas globais.
Entre
polêmicas, jogos políticos e discursos agressivos presenciamos nas
redes sociais um debate latente, ardente e contundente em torno da
famigerada pirotécnica intervenção federal na segurança pública
do Rio de Janeiro.“Luzes, câmera, ação”, assim começa a saga
quase cinematográfica da chegada das forças armadas para desarmar a
violência, varrer a criminalidade e elidir o perigo que flameja
nessa fogueira sem vaidade, que é o flagelo que se transformou o
Brasil, entretanto, com mais intensidade publicitária no Rio de
Janeiro.
Assim
como o encarceramento em massa que se deu na Europa ocidental, EUA e
Brasil, vemos que mera teatralidade da intervenção não causará
efeito, pois ela não vai na raiz do problema, na falta de estrutura,
habitação, transporte público humanizado, escolas de qualidade e
não apenas deposito de crianças, saúde, e claro, distribuição de
renda. A intervenção fará apenas o “enxugar gelo”, prender e,
se for o caso, eliminar; isso já é feito pela política de
segurança pública no Brasil que vê de forma autoritária,
conservadora a segurança pública.
No Brasil não existe projeto de polícias mais investigativas e
menos ostensivas, muito menos, de cidadania plena com maior
participação política dos cidadãos, meros eleitores em época de
eleição; não existe a intenção de divisão mais igualitária da
riqueza produzida em solo nacional. Somada a isso temos a violência
gerada pela mercantilização da vida, pela expulsão da massa
proletária, desempregada e marginalizada para as periferias das
cidades sem o mínimo de dignidade, se apertando em ônibus e metrôs
superlotados, onde o mau cheiro, o assédio, o descaso e humilhação
reina no caos degenerado; jovens sem educação, mas cheios de
oportunidades no mundo do tráfico, mulheres a beira da prostituição
e na eminência da criminalidade são jogados na roda da fortuna. A
publicidade que enche os olhos, mas que não dá oportunidades
condiciona muitos desses jovens a roubar, furtar, traficar e, com
isso, roubam suas próprias vidas, e ceifam a vida de terceiros num
carrossel de violência que começa em casa e termina na violação
de pessoas inocentes e vítimas de bandidos que acabam trancafiados
em campos de concentração chamados de presídios e cadeias
públicas, esgoto humano que não serve para reabilitar, dar
oportunidades, apenas depósito para retirar temporariamente pessoas
de circulação.
A
intervenção resolverá todos os problemas cuspidos a seco aqui
nesse texto? A resposta é óbvia, mesmo assim a intervenção foi
aplaudida por muitas pessoas cansadas da violência, do descaso, da
humilhação; essas pessoas só não veem que infelizmente será
apenas um espetáculo que durará até dezembro, com o findar do ano
se findará a ação, e com ela voltaremos a ver um Rio sem educação,
sem oportunidades e com a juventude entregue ao destino traçado,
onde elas escolhem apenas serem violentadas e passivas ou ativas.
Casos de exceção são os que conseguem mergulhar profundamente no
lamaçal de crimes, descasos, corrupção e egoísmo saindo dele sem
se entregarem ao mundo do crime.
Quando
haverá intervenção federal no âmbito social? Quem sabe chegando
nessa fase a segurança pública também seja contemplada com
atitudes mais radicais e não mera pirotecnia fantástica.
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