terça-feira, 11 de outubro de 2016

PEC 241: Os fins justificam os meios ou o Estado estupra os meios e escarra os fins?



O sol há de brilhar mais uma vez, a luz há de chegar aos corações...Letra de música, samba melancólico com fundo de esperança, mas esperar sem lutar é frustrar e chorar no final quando os caracteres subirem pela tela preta, pela sala escura soluços vão pairar no ar, um cinema de horror irá chocar os olhos virgens de sangue, um terror irá amedrontar quem nunca passou pelo abismo antes. Na letra ainda temos “é o juízo final”, me lembra algo bíblico, mas não é a luta do bem e do mal, mas a luta de interesses constitucionais, trabalhistas, sociais e coletivos contra interesses burocráticos, da classe burguesa industrial, bancária e política; estamos falando da votação da PEC241 que foi aprovada ontem, em primeira votação ontem, no dia que o eclipse da razão começou a fazer sombra sobre nós.

A emenda constitucional tem um escopo interessante, pragmaticamente falando, ela quer limitar os gastos do Estado; o discurso diz que o poder público federal, e os estaduais, estão mergulhados em um  lamaçal de dívidas e os gastos aumentaram muito, por isso, devemos diminuir os gastos para salvar o Estado e pagar as dívidas desse. Vamos lá, a finalidade me parece razoável, mas a PEC propõe meios insalubres e indigestos, tem a intenção de cortar gastos da saúde, educação, congelamento dos salários e reajustes do funcionalismo público, tudo isso dentro do pacote de engessamento dos gastos pelos próximos vinte (20) anos; o pacote ainda inclui outras medidas extra PEC, mas não vamos ampliar demais o assunto.

No capítulo anterior, já que isso aqui mais parece uma novela do Agnaldo Silva, vimos que há meios  indecentes de se cortarem os gastos do governo, eu diria até criminosos, pois além de imorais, ante sociais, são inconstitucionais também; o direito à saúde e educação pública estão sendo jogadas na latrina neoliberal, os gastos do funcionalismo e assistência social estão mergulhadas no mesmo mar fétido de detritos expelidos pelas cloacas burocráticas do liberalismo que prega o enxugamento do Estado, diminuição dos gastos público em nome de uma dívida não auditada.

Os fins justificam os meios caro príncipe Temer? A razão instrumental, utilitarista e pragmática obnubila a razão axiológica, os valores humanos, os fins financeiros do Estado acabam dessa forma justificando o massacre social, a doença do sistema, a falta de educação de nossa população, a degradação da arete. Não há mais virtude e nem cidadania, apenas eleitores e contribuintes, não somos mais fins em si mesmos, somos meios utilizados desgraçadamente pelo poder público por uma emenda constitucional que não foi debatida, foi empurrada goela abaixo nos organismos.

O Estado usa subterfúgios para retirar direitos, cidadania e o futuro das pessoas, ele poderia muito bem taxar grandes fortunas, diminuir gastos supérfluos com publicidade, jantares de galas, comissionados e obras faraônicas como aeroporto com fins turísticos, mas que vive vazio.  Porém prefere cortar na carne e jogar a alma fora. A razão mercantilista, capitalista, burguesa e instrumental que nega a humanidade enquanto fim, que transforma pessoas em meios, suportes, em coisas, objetos animalizados, essa razão está por trás do irracionalismo que será justificado pelo legalismo da PEC 241; mas lemos Antígona de Sófocles, e sabemos que há leis injustas e justiças que transcendem o legal. A luta não pode parar, pois o tempo...O tempo não para.


terça-feira, 4 de outubro de 2016

Grego, o Quixote do cerrado contra o prefeito de orgulho ferido



A nostalgia abre espaços virtuais no meio do deserto nadificante da consciência, tomamos ciência que há algo sentimental, porém, nos vem de forma inconsciente. Músicas oitentistas, séries como Star Trek, desenhos animados, olhos de Thundera, novelas com personagens protagonizados por Lima Duarte, dentre elas cito O Salvador da Pátria com seu quixotesco sertanejo Sassá Mutema; mas por que essa novela? Primeiro, minha família assistia; segundo, meu pai gostava; e terceiro, o protagonista me lembra meu pai.
Entre músicas eletrônicas, queda do muro de berlin, turbilhão efervescente da redemocratização, movimentos feministas, AIDIS, crescimento urbano, pós-modernidade e monopólio político do PMDB em Goiás tem minha infância cheia de trilhas sonoras de westerns, sonhos melosos e iluministas, imaginação encharcada de ficção-científica e um casal simples que saiu do interior do estado e veio tentar a sorte na cidade do pecado, das ilusões e da promessa da metrópole do centro do Brasil, Goiânia. Esse casal de pouca escolaridade, meu pai quase analfabeto, veio morar na periferia da cidade que brotava no meio do cerrado, meu pai acabou entrando para o serviço público, guarda municipal, e minha mãe o ajudou a me criar ( depois veio minha irmã); mas também o ajudou na sua odisseia grega, a odisseia do “Grego” Jairo, apelido advindo de sua língua presa.
Meu pai tinha um jeito pouco burguês de ser, gostava da vida comunitária, casa cheia, algazarra e de ajudar pessoas carentes, próximas ou estranhas, adorava ser o samaritano e ajudar enfermos; nossa residência sempre tinha pessoas vindas do interior, de sua cidade natal, para fazer tratamento na capital. Mesmo descapitalizado ele os ajudava e de boa vontade, essa Kantiana sem utilitarismo, pragmatismo, onde o ser humano é um fim em si mesmo, tem valor; e não um meio, uma coisa, um preço etiquetado nas costas do destino ingrato.
Dessa odisseia caseira o Odisseu Jairo acabou fazendo escola e surgiram casas de apoio baseadas nas já existentes, porém, incentivadas pelo seu esforço. Hoje ele tem sua própria casa de apoio com um sócio e presta serviços a prefeituras, dentre elas a de sua cidade natal, Santa Rita do Araguaia, cidade onde nunca morei, mas guardo lembranças de visitas de finais de ano, sabor de manga e água gelada de rio.
Depois da última eleição municipal o atual prefeito, e candidato, dessa cidade fez de forma sub-reptícia, e com subterfúgios mesquinhos, a quebra de contrato, do dia para a noite e sem aviso prévio com a casa de apoio do Heleno do sertão goiano e seu sócio de nome germânico, Clóvis. Devido a atuação de meu progenitor no lado adversário ao da situação, logo, inimigo do rei. O prefeito é do PSDB, partido do autoritário Marconi, absolutista pseudo republicano que bebeu nas águas de Pedro Ludovico, Coronel centralizador que fez o coronelismo centralista de estado, onde os chefes rurais se curvavam ao fascista aliado de Getúlio. Sem mais delongas podemos ver o perfil do prefeito dentro do contexto da política partidária goiana de direita.

A dialética do poder instrumentalizado na perseguição, na quebra de contrato, na falta de palavra e no rancor, que Nietzsche chamaria de moral do escravo, não é algo incoerente com a forma como os partidos político, instituições burocráticas, fazem. Apesar de serem burocracias, os partidos bebem da mina cordial de nossa cultura, como Sergio Buarque de Holanda analisou de forma magistral no clássico Raízes do Brasil, os políticos são homens cordiais, mais coração do que razão, mais raiva do que reflexão, mais paixão do que bom senso. As vezes mais amor, as vezes mais ódio.
Saindo da caverna platônica e passando pelos mares revoltos da Odisseia de Homero vejo aquele homem com sua bicicleta monark barra circular, vejo a nostalgia de minha infância que agora tem cabelos brancos, a admiração de várias cidades e a inimizade de políticos limitados pela luta do poder sem socialização, sem democratização, sem o povo, melhor, cidadãos, pois povo geralmente é massa de manobra para projetos autoritários fascistas. Sassá Mutema e Dom Quixote, ou seria um Sancho de pseudônimo Grego? Depois da guerra de Troia, de sereias com cantos fúnebres, ciclopes enfurecidos e eleições amargas o herói da epopeia goiana sai fortalecido, e o prefeito com sua imagem esmagada pela soberba bárbara de políticos cordiais.