domingo, 3 de abril de 2016

A MOSCA DA INTOLERÂNCIA NO BRASIL.



O sol nasce radiante, em poucas horas ele já esquenta as ilusões, aquece a preguiça dominical, lambe com seus raios lindos, brilhantes e cancerígenos tetos de casas dorminhocas, corpos sedentos por sexo, comida e cobertos de feridas. Enquanto aperto mecanicamente as teclas para cuspir palavras estúpidas, frases bonitas, razões apaixonadas, vejo uma criança correndo e sorrindo, a ignorância em relação ao mundo é uma delícia, ela saboreia cada momento dessa ignorância.
Mesmo quebrando a roda da rotina o domingo parece ser também um protocolo a ser seguido, sua indigência, seu rosto despreocupado e sua ânsia em não passar deixa o dia excepcional com jeito de mais um dia repetido, todos os domingos são iguais. Mas esse domingo também é igual aos dias comuns no quesito reflexão, pensar o mundo e ser pensado por ele, nessa fadiga de saber e saber que sei sabendo que sei vou rodopiando sobre mim mesmo e chegando cada vez mais profundamente em mim, dessa forma posso transcender sobre mim e chegar ao mundo, nesse mundo confuso, midiático, claustrofóbico e cheio de problemas em relação à alteridade.
Sei que a intolerância é uma constante, e sei que sei disso, minha consciência me faz tomar conhecimento de meu saber, dessa forma reflito sobre a intolerância e penso a mesma, tomar consciência dessa forma estúpida de ser é saber que o ser humano é estúpido sem saber, nossa razão camufla nossos arroubos apaixonados, nossas posições inconscientes, nossa razão que nos guia as vezes se esquece que também nos movemos mecanicamente.
Mas sem razão não há como refletir criticamente sobre nossas vidas, sobre nossos conflitos, sobre nossas barbáries do dia a dia. É racionalmente que tomo consciência do meu lado afetivo e de sua importância, é afetivamente que possuo meu corpo, minha mente e chego a conclusões racionais, transcendendo a pura passionalidade. Mesmo assim vemos pessoas racionais em um mundo racional se reduzirem a pura paixão, isso fica cada vez mais constante num mundo dividido politicamente entre os intolerantes “petistas” e antipetistas.
Essa semana vi uma notícia que me chocou, não foi a morte de uma grávida, estupro de um bebê ou mais um escândalo da operação “lava jato”; foi a recusa de uma pediatra em atender uma criança com o argumento, esdruxulo e mesquinho, dela, a criança, ser filha de uma pessoa filiada a um partido político, no caso aqui ao PT- partido dos trabalhadores. Isso me chocou, uma criança, que já era paciente dessa pediatra, não teria um atendimento médico por causa da filiação partidária de sua progenitora, ou seja, passou-se a escolher pacientes pela coloração política ou pela filiação partidária, isso soa no mínimo intolerante e imoral, para não dizer até criminoso.
A que ponto chegamos, sempre que nos chocamos ou nos desiludimos com algo fazemos essa indagação e sempre chegamos a mesma conclusão:  chegamos no ponto de onde saímos, da barbárie, por mais que tenhamos desenvolvidos técnicas industriais, construído edifícios filosóficos, artísticos e humanitários, por mais que tenhamos concluídos pesquisas científicas fundamentais para o desenvolvimento humano, chegamos sempre no menos digno, no menos valoroso, no menos humano; isso me lembra as críticas frankfurtianas, a dialética do esclarecimento esboçada na obra de mesmo nome.
Não acompanhei mais a polêmica envolvendo a médica e a filha da petista, mas vejo um momento crítico para a política, para a ética e para relações humanas no Brasil, independentemente do lado que estejamos, partidário ou não, temos que ter em mente a convivência, a relação e os direitos fundamentais de cada ser humana. Os dois lados da moeda estão desvalorizando o capital afetivo por agirem apenas com paixão e se esquecendo da razão. Pessoas que agem como a médica intolerante são como o personagem Seth do filme A MOSCA, são cientistas brilhantes que num ato afoito e passional se esquecem de tomar as rédeas de suas vidas e são unidas geneticamente a um inseto, depois vão se deformando, moral, psicologicamente e corporalmente até se reduzirem a um ser asqueroso, grotesco e deformado.

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