Quando você anda e olha para o
chão, ele é verde e escorregadio, parece tremer ao som de seus passos, instável
como a política no oriente médio, sensível como paixão adolescente, o solo é
transparente, através dele, do verde claro e transparente você pode visualizar o
interior da terra gelatinosa, sim, gelatina. Dentro do aguado solo percebe
restos de corpos putrefatos, que delícia, o solo é de gelatina sabor limão, no
interior dessa guloseima corpos apodrecem, vermes passeiam pelas massas
orgânicas e sem vida, você olha os vermes dançarem macabramente enquanto a
morte lhes dá vida, enquanto os defuntos deixam seus corpos gosmentos cheios de
vida, eles não sabem que são vermes, não sabem o que é biologia, classificação,
Aristóteles não era um verme, o que diferencia um Aristóteles de um verme? Aristóteles
tinha consciência, tinha cultura, você vota, acredita em deuses, em ciência,
tem fantasias sexuais, acredita no progresso da humanidade, o que nos faz
superiores aos vermes, as plantas, ao universo?
No rádio uma canção antiga, uma
música romântica cantada em uma língua estrangeira, sou estrangeiro no meu próprio
coração, como já beijei mecanicamente, nunca senti saudade, apenas tesão,
êxtase, aqueles corpos se contorcendo de prazer, bocas pedindo prazer, minha
língua penetrando seus corpos, suas bocas, suas genitálias se acoplando na
minha, nunca amei, senti saudade ou remorso,
nunca chorei com um beijo de novela, os vermes também não, aqueles dentro solo
verde limão, gelatinoso e cheio de morte, cheio de vida, saboroso, o que me
torna diferente do verme? A consciência que não sou um verme, a consciência que
sou outra coisa, a consciência que o verme é mais feliz, mas o verme não tem
consciência da felicidade, ele não é nem mais ou menos feliz então do que eu,
eu tenho consciência disso, inferno!
A praia, a areia, um oceano de
conhecimento, como sou ignorante, o mundo inteiro de leituras para ver em
Zorba, o grego, que não passo de um ignorante frente a imensidão do universo,
frente a tudo que me escapa, a poesia é bela, gozar com belas morenas, aquela
boca, nunca amei, nunca senti saudade, já senti algo, acho que era imaginário,
livros, florestas, almas, deuses, estupros, sangues, vejo gente morta,
gelatina, vermes, a vida pintada com palavras, asfalto, mar de rosas, música
dos Beatles, curtindo a vida adoidado,
carrego a arma, um tiro, imensidão, freio fora de mim, fim de mais um alucinógeno
pensar.
Crio desculpas para você, crio
subterfúgios para mim, crio problemas para todos os saberes, brigas por causa
de política, frases soltas, o que me torna diferente de você? A mesma diferença
entre nós e os vermes? Somos parte do mundo, o mundo é parte de nós, somos consciência
do mundo, o mundo existe enquanto construtor de consciência, o beijo que dei
hoje foi menos mecânico, ainda não amo, ainda sinto prazer em me torturar
pensando, gosto de filmes sobre solidão, escritos sobre moléculas de carbono,
HEY JUDE!
Como é chato acordar, abrir a janela e ver o sol,
nascendo, é tão perfeito e comum, mas a lembrança me leva para lugares
escondidos em minha mente, um solo verde cheio de corpos, cheio de vermes, como
um verme passeio pela carne podre do mundo, vejo toda a imundice e depois cuspo
sobre as fezes, como amar deve ser bom, nunca amei, sempre duvidei, isso me fez
sobreviver, já acreditei no infinito, o solo se abre, a gelatina se torna
escura, o mundo me engole, como é absurdo existir, nunca pensei de outro jeito.