quarta-feira, 24 de agosto de 2011

PAPAI NOEL, DEUS E A MATRIX.


Sonhos deslumbrantes, pegadas em areias coloridas, vibrações de fé com igrejas ao domingo, desenhos animados, vidas agitadas, ansiedade contagiante. A música ecoa em meus sentimentos, filmes de aventura, propaganda de brinquedos, pessoas bonitas, otimismo com o futuro, guerra fria, capitalismo, comunismo, orgasmos reprimidos, ingenuidade, caça fantasmas. A alegria existia, entre dores, choro engasgado.
Abro a porta, vejo uma manhã maravilhosa, eu, meu pijama, leite com achocolatado,  Tieta do Agreste, constelações, escovo os dentes, crises internacionais, inflação, Sarnei, constituição, tudo girando,  passos tímidos, pensamentos descomprometidos, perdidos no espaço, bandas, rock, saimos para passearmos pela cidade, meus pais, eu e a saudade.
O transito em Goiania ainda não era tão infernal, era uma besta desgovernada, mas ainda não era essa catástrofe. Caminhando por entre lembranças cinzas e árvores vivas meu pensamento me guia nas velhas ruas de Goiânia, minha infância, minha falta de ignorância, minha estupidez juvenil, pronto, chegamos, entramos no supermercado próximo a Avenida T7, não me lembro o nome, me lembro que já não existe mais. Dentro dele caminhamos, vejo coisas gostosas, vejo pessoas curiosas, risos, caras feias, me deparo com uma patrola de plástico, branca com detalhes amarelos, assim ela aparece a minha memória, faço um comentário, é véspera de Natal, gostaria de ganhar, tinha apenas cinco anos, ainda acreditava em papai Noel.
Natal, frio de manhã, acordo com um gosto estranho na boca, olho de baixo da cama, uma patrola de plástico branca, a mesma que vi no dia anterior e comentei com meus pais, lá estava ela para minha alegria, para minha diversão, não foi o velhinho barbudo quem trouxe, foram meus pais, o desencantamento do mundo ao estilo weberiano desaguava em meu coração, meu espírito se derretia frente ao calor materialista, amém.
As crianças me olhavam como se eu fosse um herege, um arauto da desgraça, eu sujava seus sonhos limpos, eu dizia que não existia papai Noel, que era tudo produto de um “sisitema”, uma criação, pronto, eu era o anjo malvado, o boca do inferno, as chamas do apocalipse. Foi meu primeiro passo para o ateísmo.
Quando digo que não acredito em magia, macumba, espiritismo, cristianismo, capeta ou Jesus me sinto como a crinaça que não acreditava em papai Noel, as pessoas me olham como as crianças que viram seus sonhos abalados, ir contra o estabelecido pela tradição e fincado nos corações pela fé é uma odisseia. Sair da matrix dá nisso senhor Neo.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

ANTECIPAÇÃO


Ouço uma música sobre vídeo games, vidas em nexo, terror e comédia, existência solta no espaço, gritos silenciados pela tormenta, grito comigo mesmo, fico mudo em frente a TV, gozo me masturbando, correria psicodélica, funeral da alma.Ponto final não é o fim.
Um rosto bonito, um copo, cólera, raiva, doenças da mente, sexo transparente, vida em preto e branco, caminho rumo ao Vietnã, sofro por antecipação, choro pelos mortos do futuro, os do passado são motivos de risadas.
Desenhos animados, animação com a guerra, corpos podres, sangue jovem jorrando no asfalto, passeios pela madrugada, sofro por antecipação só de pensar que estarei de volta aquele mundo, aquele calor, aquela desgraça em forma de cidade.
Filmes clássicos, comédias sem graça, tudo de graça, programa do Chaves, copos descartáveis, momentos inevitáveis, poesias em forma de prosa, comerciais alternativos sobre momentos inexplicáveis, minha existência encaixotada no texto sem vírgula, sem fim, sem parada.
Tenho que voltar, não há mais como fugir, alegria  nunca veio, mas a tristeza parecia de mentira, agora a verdade estupra minha mente.
Falsos, como são falsos os poetas da modernidade mentem que há ordem na caótica cidade, na cidade do pecado, Vietnã cheia de merda, cheia de putrefação, cheia de nada, solta no buraco do mundo, colocada no norte do estado, quente como inferno, fria como corações de soldados, estou voltando, andando para trás e trazendo todo o redemoinho de saudades de minha capital, razão social do irracional.
Flores, jacarés, lagoas, pessoas em torno de idéias, papos descontraídos, desejos destruídos, retornos malditos, estou de volta, ainda não fui, ainda não cheguei, sofro por antecipação, emoção de gente ansiosa, carinhosa é essa solidão em meio à multidão, beijos para a morte, o sono não chega, a guerra é alegre.


quinta-feira, 4 de agosto de 2011

APENAS UM TIRO

A barba por fazer não esconde sua tristeza, seu olhar penetra na escuridão da noite, seu silêncio grita funda na alma de quem chega perto. O frio chega sem pedir licença, a carne queima no inferno de seus pensamentos, ele não lamenta, não sente culpa, ele apenas olha para as estrelas e não as acham bonitas, apenas olha, apen
 Toca Roy Orbison, a música nostálgica, romântica e chata, ele ouve a música, reflete sobre sua solidão, bebe mais um copo da bebida amarga. Ela chega, seu vestido leve e colorido se mistura ao cinza da paisagem cheia de fumaça, cheia de melancolia, cheia de mais nada, o reflexo de seu ser estampando no olhar daquele homem sem palavras, sem emoção, sem mais nada.
Sua boca molhada, seu corpo quente, seu jeito descomprometido de fazer sexo, a mulher mergulha no prazer dos braços fortes, dos beijos gostosos, ela cai na ternura simples de amar, o homem de poucas palavras e gestos contidos dá o que nenhum outro lhe daria, prazer sem limites, sem vergonha, culpa ou sobrenome. Orgasmos, ela suspira, geme e contorce, ele pensa em como dizer a si mesmo que é o fim, ela sabe seu segredo, não pode mais viver, mas tem um certo carinho, uma atração incontrolável, não pensa mais, age, com um único tico ceifa a vida daquela linda e deslumbrante mulher que tanto lhe deu prazer e paz.
Não se arrepende, não tem lágrimas em seus olhos, o batimento cardíaco é o mesmo, frio como gelo, duro como uma rocha, caminha pela manhã de sol tímido, de ruas sujas, caminha por entre pessoas, ele ama a vida, ele amava a mulher da noite passada, amava seu sorriso, sua vagina, sua alegria. Odiava ter que matar, mas matava, matou a ruiva de vestido colorido por ela saber o que não deveria, por falar o proibido, matou sem pestanejar, sem hesitar, apenas fez o trabalho, apenas com um tiro. 
Um carrinho de pipoca, crianças em volta, correria, sol batendo em rostos sem magia, sem pecado, sem malícia, enquanto caminha perto dessa febre infantil ele lembra dos gemidos, da cena de amor, dos seios fartos, do esperma escorrendo, do calor, se lembrava que tinha mais um trabalho antes de abandonar a cidade, tinha que matar um banqueiro, coisa simples e rápida, esse era seu serviço, seu ganha pão, sua rotina.
O sangue escorria, o corpo esfriava, olhando no espelho e fazendo a barba imagina o que seria de sua vida se não a tivesse matado. Acende um cigarro, a fumaça faz desenhos no ar, a atmosfera cancerígena é o ambiente de um crime, sexo, sangue e ironia, o amor é trágico, é dolorido, é radiativo.