Guilhotina, eis a primeira palavra que
me vem à cabeça quando penso em Revolução Francesa. Cabeças rolando,
reis sendo decapitados, sangue, o povo na rua, tomada da Bastilha. Fome,
estupros, invasões de propriedades de nobres, ditadura dos jacobinos,
mais sangue, mais cabeças rolando, volta conservadora, império
Napoleônico, mais nobreza no poder, mais conservadorismo, um eterno
retorno nobiliárquico até a definição da burguesia no poder com sua
indústria, arte, ideologia e os lemas famigerados: igualdade, liberdade e
fraternidade.
Quando reflito sobre direitos humanos
esses lemas brilham como florescência no escuro. O artigo 5º da
Constituição Brasileira parece ser a utopia criando vida e borbulhando
“normativamente” a igualdade, a liberdade e a fraternidade burguesa.
Quando leio sobre direitos humanos a impressão que tenho é que são
direitos burgueses herdeiros dessa revolução, principalmente pela
questão da Liberdade.
O crepúsculo fecha o dia, raios
alaranjados do sol passeiam pela estética melancólica do final da tarde
e, olhando para essa imagem, vejo algo que me lembra filmes de ficção
científica. Filmes que trazem o brilho solar meio eclipsado para depois
mergulhar nas trevas góticas do pessimismo pós-moderno e cyberpunk, onde
as pessoas não tem liberdade política, são dominadas pelo Estado
Leviatã, por corporações empresariais ou por máquinas como no futuro do
“Exterminador do Futuro” e “Matrix”; porém, algo me chama a atenção, a
realidade brasileira, retorna a revolução burguesa, os lemas, a
constituição, um redemoinho caótico de pensamentos faz bailar em minha
mente as incoerências de nossa tradição, constituição e realidade, pois
falamos tanto em liberdade, em direitos políticos, em democracia, em
participação popular, em respeito as diferenças, mas poucas vezes vejo
falarem sobre a fome, sobre desigualdades sociais, sobre a miséria no
mesmo contexto. Pode haver participação popular sem educação? Pode haver
liberdade política com escravidão proletária? Pode haver democracia
numa ditadura social onde a maioria da população está presa nas garras
da pobreza, da falta de oportunidades, educação, cultura e dignidade?
Todas as indagações acima me levam ao
lema da Igualdade, que, na perspectiva burguesa liberal, é igualdade de
oportunidades, tendo relação com a liberdade. Mas e a igualdade
socioeconômica? Essa foi defendida pelos socialistas, que veem a
Revolução Francesa como limitada aos interesses da classe empresarial,
com uma liberdade que nega a miséria, as diferenças econômicas. Para os
socialistas não há democracia sem uma melhor e igualitária distribuição
de renda e participação popular.
Vivemos em um país capitalista onde
reina uma profunda desigualdade social, miséria, fome, seguida de perto
pela falta de educação, pela violência gritante e por descrença da
maioria pela política, logo, a democracia é democracia de poucos
“livres”. Como falar em direitos humanos quando não se tem o básico da
dignidade humana como habitação, saúde, educação, bom salários e comida?
Não acho que direitos humanos sejam obrigatoriamente um componente
político socialista, porém se limitar apenas ao discurso liberal e
fechar os olhos para a realidade socioeconômica é não só ser conivente
com a exploração, desigualdade e miséria, como também agente passivo do
processo que retira os direitos da maioria dos humanos. Direitos Humanos
sem igualdade e liberdade não são direitos e muito menos contribuem
para a fraternidade.
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Postado originalmente em:http://www.policiacivil.go.gov.br/artigos/direitos-humanos-sem-igualdade.html