quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Não choro mais.


Tento chorar, as lágrimas teimam em não cair, pareço estranho, pareço não ser feito de átomos, células e coração, no fundo acho que sou anormal. O peso que esmaga minha emoção não é suficiente para arrancar rios de água salgada de minhas órbitas oculares. Mortes, dores, traições, canções, toda a exuberância maldita, toda a monstruosidade bendita, todos os gritos de horror, junto cada pedaço de desgraça em meu peito e tento forçar uma gota de lágrima. Não consigo chorar.
Pinturas, sangue, crucifixo, rezas e orações, apelos, ajoelhado, criança, piedade sacana, domingo, lembranças de uma fase sem continuação, a benção. Um ser no meio das nuvens, conversas no escuro, eu acreditava em milagres, a cruz, aquele ser onisciente, presente, magnífica santidade. O mundo desencantado, cruzes quebradas, adorava chorar pensando na salvação, hoje não choro mais.
Sorriso meigo, fortes suspiros, jeito sem jeito, bocas mudas, sangue quente, constrangimento, timidez latente, eu sorria para a vida, ela retribuía com a seu colorido, eu chorava de alegria, a tristeza era apenas um gemido. Hoje não choro mais.
Um passo rápido,  a grama cheia de orvalho, formigas sem destino, vidas espalhadas pela paisagem, imagino todas as bocas, todos os estupros, assassinatos, todas as desigualdades, maldades, penso em minha própria existência, ela é cheia de saudade. O sol brilha lá fora, a grama cheia de orvalho dá lugar a caminhos cheios de angustias, mas isso não me faz chorar.
A vida adulta endureceu minha pele, fechou meus poros, sou um sobrevivente, vivi entre chacinas, entre guerras, percorri cemitérios, a morte rondou meu corpo, sou um sobrevivente pronto a desaparecer nos braços da eternidade, no meio da poeira, no fim da estrada, esse corpo sem choro e velho está preparada, pronto a ser degustado por vermes. Não choro por bobagens, minhas lágrimas são cristalinas, elas brilham ao encontro da luz lunar. A música, um réquiem, uma marcha, o horror, o sexo, o beijo, a amizade, a vida celebrada em cada palavra.
Hoje eu chorei, acordei e me lembrei da cena de um filme, uma cena simples, mas cheia de simbologia, magia. Foram apenas alguns segundos. A vida continua, as lágrimas secaram, meu rosto cheio da poeira de velhas lembranças, doces, amargas, indiferentes ao acaso, meu rosto sulcado pelo tempo onde já percorreram lágrimas. Seco, meu rosto está pálido, talvez seja o momento de terminar mais uma página.

domingo, 6 de novembro de 2011

Minhocas, sangue e esperma.


A terra úmida esconde mistérios, ele olha com seus olhos verdes para aquela terra, com um pedaço de madeira rasga a carne do planeta com sua estupidez de criança, de dentro da massa arenosa sai seres repugnantes, mas interessantes. O menino de olhos verdes acordou com um vazio no peito, vazio que o acompanhará para o resto de sua vida, naquela manhã parecia que nada fazia sentido, pelo menos até ele encontrar aquelas minhocas no quintal enquanto cavoucava com sua varinha de madeira. Os olhos verdes de Pablo brilhavam ao fitarem aquelas criaturas se mexendo, deslizando entre seus dedos finos de criança, seu coração batia mais forte de alegria, o mistério da vida em forma de minhoca, num passe de mágica ele esmagou aquelas cinco minhocas, suas entranhas se espalharam pelas mãos de Pablo, ele sorria com um ar de excitação, foi seu primeiro passo rumo à satisfação.
No rádio toca a música nikita, todo o romantismo que ele tinha naquele momento se traduz em beijos molhados, abraços apertados, a moça morena com lábios cheios de prazer mergulha na emoção dos carinhos de Pablo. Um corpo, nu, sem respiração, sem sonho, apenas lembranças, como uma minhoca esmagada, a moça estava ali sem vida, Pablo a estrangulou como se esmagasse um inseto, o prazer da agonia da vítima o excitava, aquele simpático jovem de olhos verdes se lembrava das minhocas do quintal de sua infância, ele sorria com a memória repleta de insetos e animais defuntos, cheio de alegria sua consciência era leve.
O que é a verdade? Todas são tão lindas, todas tem o brilho da verdade, não consigo pensar em apenas uma, monogamia epistemológica, filosófica e ética, quero transar com todas e ter orgasmos infinitos. Quem sou eu? Uma verdade entre tantas, uma mentira perante a verdade do mundo, um mundo desgovernado, sou o que penso ser, penso que sou nada, apenas um ser sem mais explicações. O dia brilha lá fora, aqui dentro dúvidas povoam meu cérebro, me sinto como um verme rastejando pela terra, assim já se sentiu Pablo, mas ele pisava nos vermes e logo se distanciava desses primitivos, ele cuspia no que era baixo e viu, mas também descartava o belo e inocente.
Carlos amava Pablo, desde a quinta série ele olhava para o menino de olhos verdes com ar de cobiça e ternura, Pablo deu uma chance a Carlos, com beijos lascivos, apertos no banco de trás do uno vermelho, Carlos abre a calça do seu amado e engole gulosamente aquele pênis cheio de vida, após engolir o prazer liquefeito de Pablo ele é enforcado num ato de puro desejo. Na beira da estrada ele repousou, com a boca cheia de esperma e sangue o corpo do amante foi abandonado, mais um verme, mais uma minhoca, mais um ser humano foi esmagado pelas mãos inquietas de Pablo.
A chuva teima em cair, fico pensando como pode haver tanta dúvida em meu coração, como posso ser tão infeliz em um mundo cheio de amor, chego a conclusão que não sou infeliz, sou apenas angustiado, a vida, a liberdade, o existir me angustia, será que Pablo se angustia? Não sei, apenas posso dizer que ele se embebeda das águas do desapego, ele é indiferente a vida, a seres que respiram, ele se nutre apenas de pensamentos sobre si mesmo. Quem nunca pensou em matar alguém? O que nos faz tão diferentes de Pablo, ele apenas colocou os instintos como prioridade e deixou a moral e o medo da condenação em segundo plano, seu coração não é torturado pela culpa, sua consciência não é envergonhada com o sangue alheio. O que me faz tão diferente dele? Eu não tinha tanto prazer em matar minhocas.      


sábado, 29 de outubro de 2011

A ESTRADA

A estrada, no horizonte não se vê o fim, na verdade ele não existe, todos os fins são provisórios, são apenas desculpas estéticas e pedagógicas, orgasmos de um final de transa, mas sempre transamos de novo e temos novos fins. A estrada continua com seus veículos, almas e corações, ela continua como um tapete mágico que nos leva para outros lugares, na estrada continua a viagem, o delírio, continua a percorrer um carro branco com três homens sem razão, mas com um destino, provisório, como os finais de filmes. Mais risadas, a viagem continua, a trabalho, mas mesmo assim uma viagem.
Formigas andam com sua velocidade contemplativa, o pé de goiaba está ali, ele não fala, não mente, ele apenas sente sem ter consciência disso, eu tenho consciência de tudo isso, mas isso não quer dizer que tenho controle, pelo contrário, tenho apenas consciência da caoticidade. A viagem é interrompida, chegamos ao final provisório, a cidade destino, lá fito com ansiedade as formigas em uma árvore, como do seu fruto e ouço o diálogo de meu colega de equipe com um condenado, um preso, uma alma enjaulada. O sol brilha no céu, minha dúvidas brilham em minha mente, a liberdade é carente, mesmo aquele preso é livre, tem dúvidas, desejos, mesmo aquele desgraçado tem poder sobre o seu destino, poder de fazer coisas limitas, poder de se mexer dentro da pequena caixa de possibilidades, no fim reina a liberdade, mesmo que seja apenas um sonho, apenas uma vontade, apenas a possibilidade de morrer.
A estrada, a volta, comida caseira, mais risadas descomprometidas, conversas sobre futebol, mulheres, sexo, conversas sobre cinema, tudo é contagiante, tudo se move como lesmas florescentes em nossa imaginação. O inferno queima em meu peito, os anjos tocam suas trombetas, mais um final provisório está chegando, essa banal e corriqueira viagem é mais um dia de minha vida, é mais um passo para o final definitivo dessa história sem narrativa chamada vida.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

COMO UM DEUS SOLITÁRIO.

Enquanto fazia a barba seus pensamentos se deslocavam para o além, imaginava o espaço sem luz, sem estrelas, sem nada, apenas um ser sem matéria vagando na escuridão, mergulhado na eternidade, perdido na imensidão. Os fios ruivos caiam na pia, sua pele agora branca e sem pelos, a imagem e semelhança do fantasma que vagava solitário pela escuridão, sim, apenas esse deus judeu e cristão já foi tão solitário quanto esse homem que agora ordinariamente faz sua barba ruiva.
A comida esfriava sobre a mesa, sua fome estava em algum lugar do passado, perdida junto com o mundo primitivo de igualdade utópica pregada pelos socialistas, sua coragem de viver era proporcional ao seu apetite, indiferente com a vida essa criatura de deus pensava na cor da toalha pendurada no banheiro, ele não refletia sobre o que estava a sua frente, sobre o futuro, ele apenas usava desculpas para não pensar em si mesmo. Agora sem barba, sem apetite e sem otimismo esse ser solitário como um fantasma , como um deus, irá colocar seu corpo sobre uma cama e curtirá sua insônia com toda a alegria do mundo.
O sol ilumina o mundo com seus raios, metáfora de sabedoria esse astro rei enche nosso lindo planeta com um calor infernal, enquanto trabalhadores soam em sua labuta cotidiana Carlos, agora sem barba, soa seu corpo em uma tarde de luxúria. Gemidos, tapas, mordidas, enquanto puxa os cabelos negros de Daiana e lhe dá palmadas em sua linda bunda ele pensa como é estranho viver em um mundo como esse, suor, suspiros, danação, ele goza com jatos quentes no rosto da garota de programa, sim, ele é medíocre de mais para ter uma namorada ou uma amante, ele paga pelos serviços da moça com seios fartos e cabelos longos.
Jornal, noite novamente, mais um jantar chato, mais comida que sobra no prato, notícias chatas, mais violência, o mundo sempre foi violento, sempre ouve guerras, estupros, sempre ouve alguma coisa, Carlos acha que sempre foi assim, ele não se anima facilmente, nada pode chocar esse homem.
Mais um dia, trabalho, estudos, agitação, crianças no parque, adolescentes apaixonados, pessoas estressadas, disputas eleitorais, axiomas, epistemologias e filosofias baratas, o mundo gira, mas Carlos não vê com bons olhos mais um dia rumo a morte.
Deus já sabia tudo que iria acontecer, com a sua onisciência ele já sabia do nazismo, das guerras, fomes, mentiras, já sabia que um dia Carlos iria existir e iria passar pelo mundo despercebido, ele é sacana, por isso Carlos negava que esse ser sobrenatural existia.
O espelho a sua frente, ele se masturba, enquanto sente o prazer mundano seus olhos sentem o terror da solidão, eles fitam um homem sem barba, sem emoção, sem amigos, sem rumo, enquanto Carlos goza lágrimas descem pelo seu rosto, ele se entristece, mas sabe que nascemos e morremos sozinhos.

sábado, 22 de outubro de 2011

LOVE HURTS

 Saio a noite a procura de um lugar, esse lugar não sei onde fica, na verdade não seio o que é, só sei que estou a procura de algo, alguma coisa falta em minha vida, eu ainda não sei bem o que pode ser esse "algo", saio sem destino certo, sem ideia de onde começar, apenas saio, sem rumo, direção, nenhuma orientação, minha bússula está quebrada, sem norte, nem o sol para me ajudar, a lua que está me olhando com vergonha nesse instante também não colobarora, vou assim mesmo, sou corajoso, não perco tempo, a ansiedade ronda meu ser, sou uma fera na noite.

A solidão embala meus sonhos, me alcança, beija e cospe fora, como a vida costuma fazer as vezes, ela é filha da maldita, bandida, deliciosa vida, nos momentos que me encontro sozinho olhando em volta percebo um vazio em meu peito, alguma coisa falta em mim, não é um braço, nem uma perna, é outra coisa, como um verme continua a rastejar pela Terra, esse planeta é claustrofóbico, o mundo é pequeno demais para mim, sou um ser que tem alergia do universo, não me contento em apenas respirar, as vezes penso se não seria melhor o suicídio, não sei, quem sabe, vou pensar melhor, refletir nunca faz mal.

A noite me encobre, ainda estou procurando aquele lugar, para o carro em frente a um bar, desço timidamente, bebo uma cerveja, todos olham desconfiados, uma pessoa sozinha bebendo é estranho, dá medo, a minha direita está aquela mulher de vestido roxo, ela pega elegantemente no cigarro, é excitante a forma como ela o leva boca, a fumaça sai magicamente por suas narinas, seu pulmão deve ser uma bola de câncer. Barulho, um grito, escuto risadas seguidas de um tapa na mesa, são pessoas abobalhadas e alegres, no mundo ainda existem essas pessoas, eu e minha melancolia ficamos calados, não damos bandeira, discrição é a alma do negócio, vou sair daqui, decisão tomada, vou embora.

Qual a diferença entre um verme e eu? Quase nenhuma, os dois não tem razão de ser, os dois irão morrer, a diferença é que eu tenho consciência disso, por isso sofro mais do que um verme, se fosse um burro seria mais feliz, como adoro a ignorância, ela é bela, tolo somos nós seres pensantes de plantão.

Continuo a caminhada noturna, esse manto negro de paixão, romantica, misteriosa, a noite é um convite para o beijo, para o amor, para o estupro, para a violência, para o choro, para a solidão, eu convido a dúvida, estou cansado de certezas, elas limitam, quero o aprendizado da pedagogia, não quero arrependimentos, faço o que quero e o que eu acho certo, na maioria das vezes eu me dou mal, mas a vida é assim mesmo, um dia eu gozo, no outro levo ferro, vida mais sem graça, por isso temos que sorrir de qualquer bobeira, ela é rara, temos que aproveitar cada momento.

Acho uma prostituta em uma esquina, paro o carro, pergunto quanto é o programa, ela entra, vamos ao encontro da brincadeira. Pergunto a prostituta seu nome, ela responde, Rafaela, digo o meu, Weniscley, ela ri, que nome esquisito, eu concordo, puta que pariu tenho que mudar de nome, eu também acho graça, adoro rir de minhas próprias desgraças, fazemos sexo, ela chupa como ninguém, peço para gozar em sua cara, ela topa, jorro meu prazer em sua face,. Ela se lambuza com meu orgasmo, com meu tesão. De volta as ruas, ainda não encontrei o lugar.

Rodo a noite inteira, volto para casas, tomo um gole de vinho, ouço uma música, me lembro dela, de seu sorriso, de suas curvas, seu jeito de me desprezar, falar, encantar, para cérebro maldito, assim você me mata, com essas lembranças vou chorar. Ligo o som, a música que toca é love hurts, o amor machuca mesmo, as recordações ainda mais, vai fundo, o âmago dos miseráveis. Ela se foi, não volta mais, brincadeiras, sexo, beijos prolongados, selinhos de manha, adorava seu penteado, Raquel era mesmo meu maior amor, meu tesouro, nunca vou me esquecer dela entrando na igreja, só Deus para iluminar assim minha vida, aquele desgraçado a tirou de mim, nem sei se ainda acredito no fantasma.

A cama é grande, não troquei, rolo nela abraçado com a insônia, junto do travesseiro há uma poça de água, são as lágrimas dessa noite, uma chuva de infelicidade que molhou meu desespero, o ônibus saiu desgovernado, ela atravessou a rua e chegou no inferno, sua vida foi parar em baixo de peneus, ela não me olhou mais, nunca mais ouvi sua voz, ela estava grávida de cinco meses, meu filho ficou na memória junto da mãe, a música se repete, só toca ela, o amor machuca, as lembranças dela também, já faz seis meses, como o tempo não apagou nada em mim, só intensificou, ainda não encontrei o lugar, vou continuar procurando, ainda há vida em mim.

No dia seguinte passeio com o sol em meu rosto, no parque vejo crianças, borboletas, moças bonitas, sento em um banco, adimiro tudo aquilo, contemplom a vida em sua maestria, um dia me fode, no outro me dá esperança, a beleza é um mistério, penso sobre isso e pergunto sem respostas, olho para a paisagem, a vida continua, assim penso enquanto olho.




terça-feira, 27 de setembro de 2011

O VENTILADOR


O ventilador procura por algo, o vento quente queima minhas costas, o sol brilha em algum lugar lá fora, aqui dentro apenas psicodelia, anormalidade, nostalgia e um beijo de saudade. A música starman toca sem vergonha, sem documento, toca o que realmente quer, o que realmente não sabe, o vento do ventilador harmoniza seu barulho com a música, o calor destrói sonhos ainda confusos, penso que lá fora há algo a ser revelado, esclarecido, há somente o mundo, há somente enigma.
Uma odisséia espacial, uma conversa fiada com Deus, Jeová Alá e o capeta, cuspo filosofia barata, engulo problemas metafísicos, urino em cima do destino, carrego em minha loucura o calor do dia, o desabafo da noite, a angustia de pensar um sentido para tudo isso. O cheiro de mistério desce pela garganta dos que duvidam, o orgasmo, o amor, toda a contradição nasce do criador, do destruidor, desse louco existir. Falo com ele, falo com as estrelas, com o além, nada, apenas silêncio no espaço, em minha alma, apenas o absurdo ronda minha floresta noturna.
Oração, danação, o ventilador joga em minha pele o calor, a música eterna como o fim da tarde joga em meus ouvidos lembranças, penso o que serei e vejo minha carne apodrecendo, minha voz silenciando, meu ser se perdendo.

sábado, 10 de setembro de 2011

SEM DESTINO OUTRA VEZ E NO MESMO LUGAR.


Com canetas de aço os deuses escrevem os destinos humanos na carne da Terra, com sorrisos desconfortantes eles gozam seu líquido sobre os sonhos distantes, seu tesão eterno percorre o infinito, seu amor explode como uma bomba atômica em mil megatons. Corro, as canetas rasgam a carne, tiram sangue do planeta, meu destino é traçado com tom vermelho, morte, ácido, dor e amor, tudo lacrado, espalhado, tudo reduzido ao pó que cobre a estrada, poesia sem reflexão, doença do coração, o mundo caminha sendo corrigido pela falha demoníaca, pelo desejo divino.
O destino está traçado por forças do além, assim acreditam as crianças idosas, racionais e amorosas, assim desacreditam pessoas que rompem com a tradição, deixam de ter fé em histórias absurdas, único absurdo a ter minha concordância é a falta de sentido da vida, é o doloroso abraço de partido.
Escadas, subo até acima das nuvens, em baixo tudo calmo, mesmo o caos é contemplativo, mesmo a raiva e a vingança caminham vagarosamente fitando o horizonte, sem destino, sem deus, apenas o inconsciente, o amor, sem romantismo, apenas o nada como final da reta, como louco lugar de chegada, apenas palavras em um fim de tarde, lá de cima sou um anjo que cospe palavrões, que grita estrondosamente silêncios e clarões, sou o déspota, hermeneuta sem pontuação, sou tudo, sou nada, sou quase alguma coisa, alguma coisa quase é nada. Escadas, elas param em um lugar indeterminado, chego lá, vejo o infinito, estou cego com tanta coisa, com tanta paisagem, mas nada diz a verdade, a origem, o final, somente desenvolvimento, a vida é isso, apenas caminhada, “apenas” é uma palavra sem vergonha, sou apenas palavra.
O telefone toca, não atendo, prefiro tocar eroticamente as teclas do computador, sentir o orgasmo de escrever, beber do frescor da literatura, ferver com o calor de ser humano, calor que percorre o momento que escrevo, já que estou pensando na cidade que abandonei e que retornarei, o retorno sem aconchego, sem orgulho ou preconceito, aceito o final da peça, grito gregamente pela tragédia, pela comédia, o drama de existir é uma desculpa onde apenas a morte dá sentido a trama.
Estou perdido, sem destino, sem deus, sem posição política, me acho e agarro esse momento único, esse louco e ímpar existir, não choro, não guardo o rancor pelas perdas, jogo fora toda a magia, toda simpatia pelo eterno, beijo com excitação a vida e deixo que ela sugue toda a energia que emana de meus desejos, mesmo estando indo paro o núcleo da terra, para dentro do vulcão peço aos meus pensamentos mais paciência, mais eficiência, menos razão.
Não tem nada escrito, nada dito, nada no cosmo que me leve a ficar tranqüilo, mas tranqüilizo meu ser com a certeza de nada estar certo, de nada se perder no cosmo, no copo vazio, vazio que explodi com a lógica de meus sonhos, de meus presentes passados em futuros ainda lembrados, ainda não provados.
Estou indo de volta para o mesmo lugar, isso é um fim como o de novela, sem graça, mas esperado com ansiedade.