domingo, 18 de junho de 2017

Cifrões são mais importantes do que corações: ou a poesia do capital.



Essa poesia cinza que sai das bocas fumegantes, cuspidoras de poluentes, indecentes partículas esfumaçadas de progresso, de lucros, de cancerígenos que matam pulmões, porém, fazem viver contas bancárias. Essa poesia é linda e cadavérica, o futuro é brilhantemente infortúnio, desgraças em forma mercadológica que reina na lógica irracional das calculadoras sem coração, sem tesão, mas cheias de indústrias.

A poesia é romântica, amor que sai das bocas ingênuas e burguesas, sonoramente encantadora; arrasa a dor, o odor é ameno, o suor incendeia as narinas, não tem romantismo a labuta de baixa renda, as rendas das calcinhas são mais bonitas.
Beleza que dói nos olhos com a luz incandescente, poesia solar que lambe as epidermes alvas nas manhãs românticas e queima as peles proletárias nas tardes infernais em busca de alimentos. Como é poético carregar o mundo nas costas, como é agradabilíssimo obnubilar os subterfúgios sub-reptícios dos patrícios nessa era sem gelo, apenas o sol pode nos salvar com câncer e morte ligeira.
A vida é pura poesia, ideias puras, lógica que transcende as condicionantes, as estruturas, essas correntes nuas, sem adornos, sem descrições fúteis e pomposas como as palavras ditas no escuro.
Os cifrões são mais importantes do que os corações, eis a verdade transgressora e opressora que chega poeticamente e sem verdades estridentes, apenas os belos e rebuscados versos encantam esse mundo; o capital é tão belo quanto o eterno, o pleno e verdadeiro sol platônico que nos cega fora da caverna; mas não seria uma caverna luminosa essa onde a verdade burguesa nos ludibria com firulas, verborragias, publicidades?
A poesia avermelhada que some no horizonte com o final da tarde traz melancolia, traz a letargia sonífera que nos fazem sonhar, embala beijos verbais, obstaculiza revoluções; somos tão conservadores quando apelamos apenas às formas, os conteúdos nem sempre são tão poéticos.